Apresentação – histórico
Coordenado pela Profa. Laura Sánchez García do Departamento de Informática da UFPR – e pela Profa. Tanya Amara Felipe na linha de pesquisa sobre Libras, o Grupo Design de Interação para a Inclusão e o Desenvolvimento Social possui tradição no desenvolvimento de pesquisas de caráter social, inclusivo e participativo. O grupo se interessa pela investigação de questões teóricas, metodológicas e aplicadas da Interação Humano-Computador, e áreas afins, que tenham como propósito a promoção do desenvolvimento social, e que adotem uma perspectiva socialmente consciente e responsável. O grupo possui dois professores orientadores, com potencial de atuação ampliado por vários professores e pesquisadores colaboradores e dezenas de alunos de graduação, mestrado e doutorado. Dentre os resultados de suas atividades, o grupo já produziu mais de 1 centena de trabalhos publicados em conferências, revistas e livros, além de diversos artefatos, sistemas de software, frameworks e modelos conceituais para apoiar o design de sistemas computacionais interativos.
História
Origem
A origem do grupo IHC-UFPR (recriado em 2010 sob o título “Design de Interação para a Inclusão e o Desenvolvimento Social”) se confunde com a própria história da área de Interação Humano Computador (IHC) no Brasil, pois a sua criadora, Laura Sánchez García, é a autora da primeira dissertação (1990) e da primeira tese (1995) nessa disciplina desenvolvidas e defendidas no Departamento de Informática da PUC-Rio. Tanto a dissertação quanto a tese foram orientadas pela Profa. Clarisse Sieckenius de Souza quem, juntamente com a Profa. Maria Cecília Calani Baranauskas, do Departamento de Ciência da Computação (DCC) da UNICAMP, foram as precursoras do reconhecimento da área pela SBC (Sociedade Brasileira de Computação), assim como são, ambas, nossas pesquisadoras de maior estatura
Interação aplicada a outras subáreas da Computação
Acompanhando a atuação de García no Departamento de Informática da UFPR, o grupo iniciou sua atuação por meio de trabalhos de aplicação da IHC às áreas de Banco de Dados e Informática na Educação, em parcerias abertas, respectivamente, pelos Profs. Marcos Sfair Sunye e Alexandre Ibrahim Direne. Foram desenvolvidos, então, inúmeros trabalhos de dissertação. Também de maneira interdisciplinar, foi estabelecida, nessa época, a parceria com a Profa. Claudia Robbi Sluter, da Cartografia, pela qual uma doutoranda, Profa. Lucia Teresinha Peixe Maziero, desenvolveu uma tese sobre mapas interativos com co-orientação no grupo.
Com a inclusão da disciplina de IHC nos cursos do Departamento (Bacharelado em Ciência da Computação – BCC e o posterior, de Informática Bio-Médica – IBM), a área foi se tornando conhecida dos nossos estudantes e passou a ser selecionada, mais tarde, como área de interesse específico para a Pós-graduação stricto-sensu.
Interação para a Educação Pública
O “segundo chapéu” de García, no grupo de pesquisa “Centro de Computação Científica e Software Livre” (C3SL), determinou a apropriação dos conhecimentos da IHC para a sua aplicação no design dos ambientes de interface e interação em diversos projetos de ponta para a Educação Pública junto ao Governo Estadual do Paraná (como foi o caso do projeto “Paraná Digital”, na gestão do Governo Estadual de Roberto Requião, entre outros) e ao Governo Federal (entre os quais pode se citar a distribuição Linux Educacional, distribuída, nacionalmente pelo Governo Federal na gestão de Dilma Rousseff, nas escolas do País que adotaram a política de software livre).
Apesar de, desde essa época e junto com a designer e Profa. Juliana Bueno, o Grupo vir atuando em Design de Interação para a Educação Pública, García e Bueno sentiam, ainda, a angústia de fazerem design para a maioria. Isto porque perto da totalidade da população com deficiências se encontra em situação de “exclusão exponencial”, pois pertence à classe da base da pirâmide social e é, ainda, excluída pela sua “deficiência”. Emolduradas pelo contexto socialmente inclusivo que o País atravessava, surgiram, naturalmente, a motivação para a busca da acessibilidade primeiro e, ao identificar as situações de alijamento a que muitas comunidades estavam relegadas, para o suporte à sua inclusão e ao seu desenvolvimento pleno depois, ao mesmo tempo em que se vislumbrou a necessidade de adesão à prática do design universal.
Interação para a Inclusão e a Educação de Surdos
No âmago do design para a inclusão e o desenvolvimento social e sem experiência no segmento, o Grupo iniciou suas atividades de pesquisa com base em literatura oriunda da Psicologia Experimental, que, mais tarde, se provou inadequada para os princípios e os propósitos do grupo, por trabalhar com o conceito de “normalidade” da Clínica Médica. Foi a partir do contato e da parceria com Sueli Fernandes que o grupo fincou bases sólidas sobre a Cultura Surda e, decorrentemente, para o design de artefatos tecnológicos com potencial de ação social para essas comunidades. Uma tese que desenvolveu um ambiente de apoio à construção inclusiva de conhecimento envolvendo os perfis Surdo, Não Surdo e Intérprete, de autoria da Profa. Daniela Guilhermino de Freitas, e uma série de dissertações, foram desenvolvidas para esse público, ao redor de uma arquitetura que tem por núcleo um modelo de representação computacional da estrutura da Libras (desenvolvido na tese do Prof. Diego Roberto Antunes) e compreende os níveis de software básico, ferramentas e aplicações. Após a colaboração inicial da Profa. Sueli Fernandes, a maioria dos trabalhos neste projeto foram desenvolvidos em co-orientação juntamente com a Profa.Tanya Amara Felipe, do INES (Instituto Nacional de Educação de Surdos).
Interação de apoio ao Letramento (crianças Surdas)
Paralelamente, o grupo resgatou a vocação de seus membros para o Letramento (ensino-aprendizagem da leitura crítica e da escrita visando a sua apropriação social), voltando inicialmente seus esforços para o letramento de crianças Surdas em Língua Portuguesa (LP) escrita. A partir dos resultados de um estudo in loco do Método de Letramento pela Via Direta da Associação Francesa para a Leitura (Association Française pour la Lecture – AFL), e de sua socialização junto à professora Regente de uma turma de letramento de uma escola bilíngue de Surdos pública da Região Metropolitana de Curitiba – Suellym Opolz, Juliana Bueno, juntamente com Suellym, levaram quatro crianças Surdas na 3a série do Ensino Fundamental sem motivação anterior para a leitura e a escrita em LP a se apropriarem delas com fim social de forma irreversível.
Interação de apoio ao Letramento e à construção de conhecimentos por crianças com deficiência visual
Após a experiência do grupo na escola bilíngue de surdos, a leitura de um artigo de divulgação científica chamou a atenção de Laura para o processo de “desbraillização” (desconstrução da prática social da leitura e da escrita em Braille – tido pelos estudiosos como O passaporte por excelência para a aquisição da cidadania plena pelas pessoas com deficiência visual) em curso e determinou o tema de um pós-doutorado: alfabetização de crianças cegas. Durante esse ano, o trabalho, evoluindo a partir dos resultados da tese de Juliana Bueno para o letramento de crianças Surdas, buscou o mapeamento dos requisitos específicos que um ambiente de apoio ao letramento de crianças com deficiência visual deveria ter. A pesquisa envolveu uma prática estritamente obrigatória que se refere às discussões continuadas dos resultados parciais com a Profa. Maria da Glória de Souza Almeida, do Instituto Benjamin Constant, referência nacional na alfabetização de crianças pelo sistema Braille. Incluiu, adicionalmente, a colaboração parceira de Regina Caldeira de Oliveira, membro da primeira Comissão de Braille do País, atualmente coordenadora da revisão de material em Braille da Fundação Dorina Nowill. Esse esforço rendeu uma dissertação em fase de finalização, mais uma recém iniciada, uma tese em andamento e outra prevista, agora ampliando o objetivo para o design e desenvolvimento de ambientes de interface tangíveis de apoio tanto ao letramento quanto à construção de conhecimentos de maneira geral.
Interação de apoio à Educação de pessoas com deficiências sensoriais múltiplas
Na esteira da ação no apoio à inclusão e ao desenvolvimento social, García assistiu, em 2016, o Fórum de Pessoas com Surdocegueira e com Deficiências Sensoriais Múltiplas, organizado e executado conjuntamente pela AHIMSA e a USP-Educação e ocorrido na cidade de São Paulo. Após o Fórum, García visitou e se sensibilizou com o trabalho da AHIMSA, Escola dirigida pela Profa. Shirley Rodrigues Maia que busca, caso a caso, dar condições de autonomia (poder de decisão) a pessoas que, normalmente, tem a sua vontade desconsiderada até no âmago do núcleo familiar.
Durante o Fórum, foi possível identificar os principais problemas e desafios enfrentados por essas comunidades e pelas comunidades de pesquisa e de educação. Soubemos que o desenvolvimento, a educação de indivíduos exige muitas vezes dedicação pessoal (do “parceiro de comunicação”) e que isto leva à situação de quase exclusão dos pesquisadores da comunidade acadêmica (e da decorrente falta de bibliografia relacionada), de partida, pois o conjunto de pessoas nessas condições não é significativo para justificar P & D (…) porque, em sendo a situação de comunicação praticamente individual, os trabalhos são considerados pouco embasados do ponto de vista teórico. Nessa situação, e a partir das necessidades destas comunidades, propusemos o design e o desenvolvimento de um ambiente de compartilhamento de relatos de experiências (estudos de caso) de educação de pessoas com surdocegueira e deficiências sensoriais múltiplas apoiadas em referentes teóricos de Comunicação Alternativa, entre outras áreas de pesquisa desse segmento da Educação Especial.
Interação de apoio ao treino da solidariedade e à prática da colaboração
Ainda pela lente da justiça social, desta vez pelo prisma da necessidade de tolerância para a Paz mundial, o grupo se associou ao AND-Lab, da antropóloga Dra. Fernanda Eugênio, em Lisboa, para desenvolver versões distribuídas do Modo Operativo AND, que, em forma de jogo, permite aos participantes se conscientizarem de seus respectivos graus de intolerância em relação opiniões divergentes e a treinarem a tolerância e a construção colaborativa. Esta parceria deu lugar a uma dissertação já defendida e a uma tese prevista.
Situação atual
Em 2016, após 20 anos de “desbravamento social” do terreno e de construção de espaço propício à pesquisa em IHC no Dinf, este departamento passou a contar com um novo docente (1o lugar em concurso público multi-área com 13 candidatos) de relevância especial para o grupo: Prof. Roberto Pereira, oriundo do grupo de pesquisa em IHC da UNICAMP. Este pesquisador trouxe um salto qualitativo ao grupo, que passou a contar com dois pesquisadores da área, além dos colaboradores de outras subáreas da Computação – Grafos (Prof. André Pires Guedes) e Robótica (Prof. Eduardo Todt) – que já apoiavam o grupo participando de projetos e (co)orientando trabalhos de mestrado e doutorado. O ingresso de Pereira representou, adicionalmente, um catalisador do processo de atuação conjunta entre os grupos da UFPR e da UNICAMP.
Graduado em Sistemas de Informação, Roberto Pereira fez seu Mestrado em Ciência da Computação na Universidade Estadual de Maringá (UEM), sob orientação do Prof. Sergio Silva, e seu Doutorado em Ciência da Computação na UNICAMP, sob orientação da Profa. Maria Cecília Calani Baranauskas, ambos na área de IHC. Durante seu Pós-Doutorado na UNICAMP e na Universidade de Reading na Inglaterra, Pereira consolidou sua área de atuação em IHC com foco no design socialmente consciente de sistemas computacionais interativos. Com experiência em diversos projetos de pesquisa nos contextos de e-Cidadania, Inclusão, e Informática na Educação, suas pesquisas articulam a área de IHC com Engenharia de Requisitos, Sistemas de Informação e Sistemas Sociotécnicos. Seus principais tópicos de pesquisa envolvem Design Participativo, Semiótica Organizacional, Redes Sociais e Web Social, Valores Humanos e Cultura em IHC.
Em 2017, o grupo continua atuando em torno dos três eixos (não mutuamente exclusivos) descritos: Arquitetura Computacional para Interação em Libras, Ambientes de apoio ao Letramento para todos e Ambientes de apoio à solidariedade e à colaboração humanas, e daqueles trazidos por Pereira: Design Socialmente Consciente e suas teorias, métodos, técnicas e aplicações.
Princípios e estratégias metodológicas
Os princípios que vem dando sustento à caminhada do grupo são listados a seguir.
Visão inicial pessoal de mulher, uruguaia, brasileira, latino-americana e, de forma geral, de “cidadã do Mundo”. Entre outras coisas, esta visão levou ao projeto de arquiteturas, ferramentas e aplicações computacionais passíveis de apropriação, adaptação e extensão por pesquisadores de outros países. Isto foi possível, num dos projetos eixo, pelo fato de os componentes fonológicos das línguas de sinais serem de caráter universal (limitados pela fisiologia dos movimentos) e, em outro, pelas possibilidades de internacionalização e localização colocadas como requisito. Esta visão foi ampliada, durante o percurso, pela conjunção das visões aportadas pelos diversos participantes (mais recentemente e de forma especial pelo ingresso do Prof. Roberto Pereira), sua cultura de origem e sua perspectiva humana.
Necessidade de priorizar o papel de educadores – para o exercício da cidadania consciente e solidária – sobre o de professores de disciplina (sem prejuízo deste último);
Indissolubilidade entre Ensino, Pesquisa e Extensão. Este princípio nos levou à necessidade de enxergarmos o espaço de trabalho na Universidade Pública como “trincheira” de construção de conhecimento com o objetivo principal de intervenção social. Esta visão é compartilhada por outros grupos de pesquisa dentro da Ciência da Computação, embora não seja a mais comum;
Compreensão da paz não somente na acepção de oposição à guerra mas, também e de forma inter-relacionada, como um estado que não pode ser alcançado sem justiça social;
Prática da pesquisa de forma multi, inter e transdisciplinar. Multidisciplinar, pela atuação conjunta com outras disciplinas. Interdisciplinar, pelo aproveitamento das diferentes visões por elas trazidas que permitem uma perspectiva mais ampla de análise. Transdisciplinar, pela busca incessante dos espaços de apropriação do caráter inovador da tecnologia, o que determinou a construção de novos conhecimentos que não poderiam ser categorizados como pertencentes a uma qualquer das disciplinas das diferentes parceiras.
Construção de conhecimento no processo científico sempre em parceria com os respectivos especialistas das diversas áreas de conhecimento (em Informática chamadas de “áreas de aplicação”) envolvidas. Os professores pesquisadores de outras disciplinas do saber com os quais trabalhamos de forma mais próxima são:
Lúcia Peixoto Cherem, professora doutora do Departamento de Letras da UFPR hoje aposentada (letramento no seu caráter de apropriação social da leitura e da escrita que considero preponderante em relação à alfabetização);
Sueli de Fátima Fernandes, professora doutora do Departamento de Letras da UFPR (Cultura surda e Língua Brasileira de Sinais – Libras), até 2013;
Tanya Amara Felipe, doutora em Linguística, professora titular aposentada da Universidade Estadual de Pernambuco e professora adjunta do Instituto Nacional de Educação de Surdos (Libras – em todos os níveis de análise linguística, e Educação de Surdos);
Maria da Glória de Souza Almeida, mestre e doutoranda em Educação, professora alfabetizadora de crianças cegas e referência nacional, do Instituto Benjamin Constant;
Shirley Rodrigues Maia, doutora em Educação pela Universidade de São Paulo – USP e criadora e diretora da AHIMSA, escola para a educação de pessoas com deficiências sensoriais múltiplas, situada na cidade de São Paulo;
Fernanda Eugênio, doutora em Antropologia, fundadora do AND-Lab, laboratório de pesquisa e intervenção social em prol da construção de valores humanos e sociais.
Construção do conhecimento de apoio às comunidades excluídas juntamente com estas comunidades. Isto foi efetivado, em dois dos projetos eixo, por meio de oficinas periódicas envolvendo surdos (na sua maioria alunos do curso de Letras-Libras da Universidade), intérpretes e não-Surdos (os alunos membros do Grupo de Pesquisa durante o desenvolvimento de seus trabalhos acadêmicos) e num terceiro, a partir da adoção da metodologia de Pesquisa-Ação junto a uma escola de crianças surdas da Região Metropolitana de Curitiba.
Evolução do foco da acessibilidade (vista como condição sine qua non) para o da inclusão (salto surgido a partir da arguição da candidata Juliana Bueno durante a defesa de sua dissertação, um de nossos primeiros trabalhos de Mestrado do Grupo, por Maria Cecília Calani Baranauskas, professora titular da Universidade de Campinas – UNICAMP) e o desenvolvimento social das comunidades excluídas.
O Grupo tem desenvolvido e mantido uma tradição de pesquisas com contribuição para o desenvolvimento social em sua perspectiva mais ampla, e tem crescido em termos de participantes, diversidade de tópicos trabalhados, e de bases teóricas e metodológicas empregadas. O grupo tem constantemente estabelecido novas parcerias de trabalho, e está aberto para alunos de Doutorado, Mestrado e Graduação que tenham interesse na pesquisa e desenvolvimento em IHC, de forma socialmente responsável.